quarta-feira, 9 de janeiro de 2008


ADEUS, LISBOA

É tempo de deixar-te a sós Lisboa.
De abraçar-te, num adeus final.
Como um pássaro cinzento, anjo à-toa,
que abre as asas quebradas e voa...
até cair no volumoso Tejo,
em doloroso ato terminal.

Bem sabes tu, Lisboa, que na vida
ave perdida não escolhe a sorte.
Apenas abre as asas ao tempo e voa...
Além fronteira, segue sem destino.
E, de tanto voar a vida inteira,
acaba por traçar a própria morte.

Ainda hei de voltar-te. Não sei quando.
E, num extremo gesto de alma pura,
acariciar-te, desvendar-te inteira.
Cruzar-te, uma a uma, as velhas ruas.
E como fazem as mulheres nuas,
guardar-te no meu corpo com ternura.

Ah... Lisboa... Lisboa... se soubesses
o quanto te amei, e ainda te amo,
tu não deixavas que me acorrentassem
e me quebrassem as delicadas asas.
E, num só tempo, como fazem as damas,
proclamava-me o amor que hora reclamo.

Depois de mim, eu sei, outras virão.
Todas de ti torna-se-ão amantes.
Algumas beijarão os teus cabelos.
As outras deitarão sobre os teus ombros.
Mas nenhuma delas, em teus escombros,
beijar-te-á os seios agonizantes.

Entre o nó na garganta e a dor no peito,
despeço-me de ti, bela cidade!
Deixo-te o brado vivo do poeta,
o grito do "quilombo" em liberdade.
Mas... levo a dor dos fados brasileiros,
e um coração morrendo de saudade.

Kátia Drummond
Em inverno português. Sintra, 2008.

9 comentários:

Lau Siqueira disse...

Um belo poema, Kátia. Muito obrigado pelo prazer estético em mim proporcionado.
beijos!
Lau

Anônimo disse...

Todo o espectro poético português, aquela melancolia que vem desde Pessoa e aportou, inclusive, em terras brasileiras, achei em seu poema, querida Katia.
Bonito ele
Um beijo
Adolar Marin

Ivo Korytowski disse...

Maravilha! Ai que vontade de visitar Lisboa!

Unknown disse...

Ah! Que saudades de ti, Claudio , Sintra e Lisboa, ainda hei de voltar a ti Lisboa.

Grandes beijos saudosos,

Erlon

Anônimo disse...

Quando nos aconchegamos no encontro natalino, já os traziamos juntos ao ultramar daqui, a Lisboa daqui, a Sintra daqui. Quando voltamos aqui, no tupiniquim, já vinhamos juntos. Tudo são estágios, o tempo-espaço é cebola, sempre vivemos eternamente juntos. Não digo que vos espero, já os trouxemos juntos, mesmo hannah, e a brisa sueca. Somos(estamos) sempre benvidos.Gracias por tu ternura-poesia. Dercio-Sossó

Graça Vieira disse...

Lisboa,
da poesia, das emoções pungentes...dos meus planos de viagem...
Estímulos poéticos
Gal Vieira

Helena. disse...

Pôxa, que pena que vc voltou antes de eu conseguir ir à Europa! Tenho certeza de que seria muito mais interessante conhecer Sintra ou Lisboa através da sua visão poética, do que simplesmente através de uma mera visão turística.
Mas agora é o solo brasileiro que voltará a contar com sua poesia.
Beijos!
Helena.

della-porther disse...

amiga querida

vim matar as saudades e te contar uma novidade:
o Cidade está de meia-cara nova
http://cidadesitiada2.blogspot.com

te espero.

beijos

della

carmen disse...

Katia,
Gostei muito da tua poesia, muito.
Peço licença para por no meu blog a tua poesia Adeus Lisboa; ainda tenho forte em mim as saudades de que falas.
Parabéns.
Carmen